quarta-feira, 23 de setembro de 2015

Amor, Compaixão e vegetarianismo



Texto do Livro YOGA - INSPIRANDO PAZ. EXPIRANDO AMOR (Carlos Henrique Viard Junior) 


     Não podemos pensar em caminho espiritual sem destacarmos os princípios da paz, do amor e da compaixão. Quando fazemos votos de despertarmos essas qualidades em nós, naturalmente vamos buscar tornar-nos uma benção para todos os seres, espalhando felicidade em todas as direções, não causando sofrimento a ser algum. Sai Baba resume tal aspiração numa pequena, mas grandiosa, frase: “Ajudar sempre, ferir jamais”.
     Num primeiro momento, pode parecer impossível a realização dessa orientação, (“Ajudar sempre, ferir jamais”), pois as palavras “sempre” e “jamais” geram a ideia de que nunca estaremos ao alcance de tal realização.  Não podemos, porém, durante a caminhada, esquecer que espiritualidade, Yoga, é um encontro com Deus. É o despertar da Consciência Divina em nós. Ela é essencialmente amorosa e pacífica e, uma vez desperta, preenche todo nosso ser de amor e compaixão. Assim, quando pensarmos, falarmos e agirmos, teremos como intenção ajudar sempre e o máximo cuidado em jamais ferir.
     Lembremos que a Força Divina tudo pode. Não meçamos essa força a partir dos nossos parâmetros humanos.   Entreguemo-nos a ela e deixemo-la agir livremente através de nós. Sigamos o exemplo de Jesus, que disse: “De mim mesmo nada posso fazer; quem realiza as obras é o Pai, que está em mim”. Sigamos também sua sublime orientação ao dizer: “Seja perfeito como é perfeito o Pai Celestial”. E, por fim, seguindo o caminho ensinado pelo Mestre, poderemos afirmar como Ele afirmou: “Eu e o Pai somos Um!”. Conquistaremos o que a Yoga tem a oferecer-nos.
     Na jornada do humano ao divino, despertar a consciência interna é nossa meta.  Faz parte do método para alcançar a meta tornarmo-nos pacificadores, amorosos e compassivos. À medida que vamos purificando nossos corações, o esforço vai tornando-se desnecessário, vamos percebendo essas qualidades brotando da fonte pura que é nossa divindade interior.
     Então caminhamos na direção de Deus, rumo ao nosso ser interior.  Buscamos a Verdade. Levantamos as bandeiras da paz, do amor e da compaixão! Sua Santidade, O Dalai Lama, considerado pela tradição do budismo tibetano como uma emanação da compaixão, define-a como “nossa incapacidade de ficar alheio ao sofrimento do outro”. E se existe alguma coisa de que o amor não é capaz é justamente esta: ele não pode ficar alheio ao sofrimento. Pois, se o fizesse, estaria contrariando a sua própria natureza, que é “ajudar sempre”.
     Albert Schweitzer, indo ao encontro dessas ideias, define a ética humana da seguinte forma: “Um homem é verdadeiramente ético apenas quando obedece à sua compulsão para ajudar toda a vida que ele é capaz de assistir e evita ferir todas as coisas que
vivem”. Podemos sentir, em nossos corações, a verdade contida nessa afirmação.  Mas possuímos uma tendência que limita nossa ação pacificadora, pode fazer com que ajamos sem amor e esqueçamos totalmente a compaixão. Albert Schweitzer também ensina que “o erro da ética, até o momento, tem sido a crença de que só se deva aplicá-la em relação aos homens”.
     Em nossa jornada humana, buscamos, cada vez mais, desenvolver o amor e a compaixão por nossos irmãos humanos. No entanto, como já vimos, o verdadeiro amor é incondicional e ilimitado, deve abranger todos os seres, toda a criação. Lembremos que não buscamos aqui uma teoria que nos mantenha na área de conforto, mas a verdade que liberta. O yogue deve fazer votos de ter coerência de pensamento, palavra e ação.  Nossos pensamentos devem estar sempre de acordo com nosso coração.
      Gostaria de sugerir, assim, uma reflexão sobre como nos relacionamos com o reino animal. Nesse relacionamento, somos amorosos e compassivos? Pois é esse nosso objetivo por aqui: revelar amor e compaixão ilimitados. Como tratamos os animais? Seríamos capazes de fazer algum mal eles?
     Acredito que você tenha o desejo sincero de ver todo o reino animal feliz.  Acredito, também, que você se sinta mal somente em pensar em gerar sofrimento para qualquer ser do reino animal. Nosso coração nos diz, no silêncio, que devemos “ajudar sempre, ferir jamais”. De nosso coração emanam amor e compaixão.  Pensamentos de impingir dor estão em desacordo com nosso coração, e, por isso, só de pensarmos em gerar sofrimento, sentimo-nos mal. Mas, mesmo assim, muitos de nós, por falta de atenção (e, consequentemente, insensibilidade), somos responsáveis pelo sofrimento intensivo de milhares de seres do reino animal. Todos os dias. Para justificar essa dura afirmação, pergunto-lhe se você ainda come carne.
     Não temos como negar que a alimentação carnívora promove extremo sofrimento a nossos irmãos animais. Diariamente, a matança deles produz rios de sangue. Vacas, porcos, aves, peixes e muitos outros são submetidos a uma vida de privações e dor desde o nascimento até o momento do abate. Quantos de nós conseguiríamos sentir, num abatedouro, a mesma paz e tranquilidade que sentimos num ambiente de animais soltos e bem tratados? Como nos sentiríamos visitando um abatedouro?
     É muito importante encararmos a verdade.  No caminho espiritual, temos de ser absolutamente sinceros! Os abatedouros só existem por uma única razão: há consumidores da carne dos animais mortos ali. Logo, todos que comem carne patrocinam essa tragédia diária.  A alimentação carnívora, não é, portanto, compatível com os princípios do amor e da compaixão.  Se você ainda come qualquer tipo de carne, por amor, vença esse hábito.
     Quando olhamos de frente essa situação, algo se revela em nós, dizendo-nos que devemos superar o hábito de comer carne.  Esse algo é o amor, a voz do nosso coração. Mas também percebemos, em nós, outra voz que nos sugere continuarmos com ele, ignorando nosso coração.  É a voz de nosso egoísmo, do apego ao prazer, da ignorância.  Lembremo-nos de que o egoísmo sempre surge disfarçado de sabedoria. Logo surgirá dele uma teoria que justifique a alimentação carnívora e ela será muito convincente. Mas o que diz seu coração?
          São muitas as motivações que devem levar-nos a abandonar o consumo de qualquer tipo de carne. Citarei apenas quatro, embora possa enumerar muitas mais.
  1. Despertar o amor e a compaixão

     Sendo o amor concretizado por “ajudar sempre e ferir jamais”; sendo a compaixão definida como “nossa incapacidade de ficarmos alheios ao sofrimento do outro (todos os outros)”, abandonar o hábito da alimentação carnívora tornar-se-á uma ação verdadeiramente amorosa e compassiva.
  1. Vencer o medo que é gerado a partir da ignorância

     Muitos se alimentam de carne pela crença de que, sem ela, não obteríamos os nutrientes essenciais para manter-nos saudáveis e fortes. Esta crença é absolutamente errada. Existem inúmeros outros tipos de alimentos capazes de substituir todos os nutrientes oferecidos pela carne. Consulte um bom nutricionista e certamente será orientado sobre como preparar sua nova dieta. O medo, às vezes, é tão grande que obscurece totalmente nosso discernimento e  faz-nos seguir na contramão do amor. Existem famílias (inclusive as crianças) que, desde muitas gerações, não ingerem carne, e seus membros caracterizam-se por terem saúde forte e longevidade.
  1. Libertação do apego ao prazer

     Em nossa cultura, o hábito da alimentação carnívora é muito arraigado. Muitas vezes, está relacionado a momentos de comemoração. Ao comer carne, é comum sentirmos, por meio do paladar, grande prazer e, na dimensão mental, grande sentimento de alegria. Um dos maiores obstáculos para deixarmos esse hábito que implica sofrimento extremo para os animais,  fazendo-nos responsáveis por isso, é justamente o apego ao prazer. O apego faz tanto barulho em nossa mente que não nos deixa mais ouvir o coração.  Abafa o amor. Não é nossa inteligência que escolhe manter esse tipo de alimentação, mas sim nosso condicionamento, nossas energias de hábito. Quando escolhemos deixar para trás um hábito tão arraigado como esse, estamos começando a trilhar o caminho da liberdade! Somente o Amor será capaz de dar-nos a libertação!

  1. Favorecer as próximas gerações
     Hoje, a produção de carne está devastando o planeta. As florestas são desmatadas para construção de pastos e para plantação daquilo que virá a ser o alimento dos animais que viverão infelizes por lá. Esses milhões de seres, tratados como produtos, gastarão milhares de litros de água do momento em que nascem até a hora da morte. Durante a vida, naturalmente urinam, defecam e soltam gazes, tornando-se uma bomba para o planeta, pela quantidade desmedida de animais que é “produzida” diariamente. Também por amor ao planeta, às florestas, à vida e às futuras gerações, devemos parar, o quanto antes, de comer qualquer tipo de carne.
      Esse apelo brota do fundo de meu coração. Não tenho a intenção de rotular os vegetaríamos como amorosos e os não vegetarianos como não amorosos.  Isso seria um absurdo. Conheço pessoas que comem carne e são extremamente generosas, bondosas, amorosas, revelando ainda outras valiosas virtudes.  Aprendo muito com essas pessoas. E conheço alguns vegetarianos que são pessoas de difícil convivência. Quero dizer, assim, que ser ou não vegetariano não define o caráter de ninguém.
      Acredito, porém, que quem ainda se alimenta de carne está num estado de desatenção. Não olha profundamente para as consequências de seu hábito.  De maneira alguma, é mal-intencionado. Aqui, sinceramente, não faço o julgamento de pessoa alguma, porém avalio o hábito de comer a carne dos animais e seus desdobramentos, as forças internas que sustentam esse hábito e o quanto as qualidades essências do nosso ser verdadeiro se tornam obscurecidas enquanto praticamos este tipo de alimentação.
     Minha intenção ao expor essas ideias é despertar a consciência. Esse processo é sempre de dentro para fora. Peço que você acolha essas ideias e pergunte a seu coração o que fazer com elas. Siga sua orientação interior.
      “Pela moderação e modulação dos hábitos de comer e beber podem-se estabelecer as bases para uma vida espiritual. Você deve preferir os alimentos sátvicos (puros e vegetarianos) aos alimentos rajásicos. Ao ingerir bebidas inebriantes, a pessoa perde o controle sobre suas emoções, paixões, impulsos, instintos, fala e movimentos e desce ao nível de uma fera. Ao comer carne, a pessoa desenvolve tendências violentas e doenças de animais. A mente torna-se mais intratável quando a pessoa se entrega à comida rajásica. É difícil remodelar a mente se tal alimento é consumido com prazer. Para habitar em Deus, a pessoa deve ser vigilante sobre a comida e a bebida consumidas, tanto pelo corpo como pela mente”.                        
Sathya Sai Baba


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